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A EXPLOSÃO DAS ILUSÕES REPRESADAS

Foto do escritor: Sued CarvalhoSued Carvalho

Sued Carvalho, professora





Na semana passada a cena eleitoreira brasileira deu um cavalo de pau. Na segunda feira, 08/03/2021, o ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Edson Fachin anulou as condenações relacionadas ao ex-presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva. Do dia para a noite, após 580 dias, Lula era elegível mais uma vez, pegando todas as forças políticas, da esquerda radical à extrema-direita, de surpresa.


Atuando neste novo ato do teatro de fantoches da política eleitoreira, todos começaram a tomar suas posições sob a luz da ribalta. A extrema-direita, capitaneada pelo excrementíssimo presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, procurou demonstrar tranquilidade, afirmando que isso não ameaçava seu projeto; a direita liberal, sempre linha auxiliar da extrema-direita, procurou apostar na narrativa mercadológica, afirmando que seu deus, o mercado, essa entidade que flutua sobre nossas cabeças, sem nunca pisar no chão, estava triste e, assim sendo, o dólar teria tido alta de 1,7% e a IBOVESPA teria caído 4%; A esquerda liberal comemorou a decisão, em sua narrativa super-heróica onde Bolsonaro seria Darkseid e Lula seria o Superman na luta pela cadeira de presidente, com exceção de Ciro Gomes, que sentiu-se colocado de lado e viu suas ambições irem para o buraco, não perdeu tempo, entretanto, e começou a vender-se como terceira via; a esquerda radical, por sua vez, manteve a mesma narrativa, acertada, de que apenas um movimento de massas popular é capaz de dar sustentação a um governo de esquerda, logo, pensar em eleições agora, seria apenas preparar o caminho para um novo golpe, seja ele parlamentar ou militar.


A narrativa da esquerda radical, apesar de ser a única minimamente embasada e sensata – afinal, se Nicolás Maduro ainda resiste aos ataques incessantes e brutais do imperialismo é por contar com um movimento popular atuante e poderoso, coisa que Lula e Dilma não consideraram sequer fazer e, por isso, Dilma caiu em 2016 como se derruba um castelo de cartas – Foi vista como estraga-prazeres ante a explosão de felicidade que, devido a hegemonia liberal na esquerda, se instaurou nas organizações que afirmam lutar pelos trabalhadores. Por um lado é compreensível, as organizações de esquerda estão cansadas de perder e estão felizes por terem, ao menos, uma vitória, mesmo que falsa, por outro lado, rumam para o mesmo precipício, em uma trágica história de cão correndo atrás do próprio rabo.


Tá certo, então Lula deveria continuar preso? De forma alguma, um homem preso em um processo viciado por um crime que não cometeu deve estar livre, passou até tempo demais preso, inclusive, porém comemorar a liberdade de um homem não significa abraçar a sua lógica eleitoreira.


Entretanto, o que Lula fez, desde que foi solto, politicamente? Deu base ao discurso de frente ampla, mesmo para organizações que, majoritariamente, falavam contra esta estratégia, como o Partido Socialismo e Liberdade, que já planeja abdicar da candidatura presidencial em 2022 para apoiar Lula, assim como algumas correntes mais combativas do PT, que vinham encontrando certo eco devido à falta de alternativas, foram isoladas. Ilhadas também foram os partidos que defendem uma união de esquerda, popular contra o Bolsonarismo, rechaçando a Frente Ampla, viraram os “velhos do fim do mundo” da política brasileira.


Como se fosse pouco trabalhar para enterrar as alternativas populares em nome da estratégia eleitoreira, Lula também escuta e acolhe as expectativas dos grupos que estão a enterrar o Brasil no mais rasteiro neoliberalismo e já é sondado o economista liberal Marcos Lisboa para trabalhar em uma possível campanha lulista, visando dar “caráter centrista” ao candidato.


É absolutamente ridículo e patético o deserto de ideias que se tornou a esquerda brasileira, disposta a derrotar a pessoa de Bolsonaro, mas não o seu projeto. Não é o fato de Bolsonaro xingar jornalistas (Embora isso seja absolutamente condenável) que está matando milhares de brasileiros de coronavírus e lançou mais de quatorze milhões de famílias na extrema-pobreza, é o neoliberalismo, não se propõe a romper com esta lógica, persistem os falidos projetos de gestão moral da pobreza. Na lógica eleitoreira que agora é admitida com orgulho pela maioria dos esquerdistas reina o quanto melhor pior, lamentam-se os 2.300 mortos pela covid em 10/03/2021, porém, ao mesmo tempo, pensa-se que isso irá manchar a imagem de Bolsonaro e beneficiar uma futura campanha eleitoral de “esquerda”. É uma linha de raciocínio macabra.


Deixar de se movimentar no sentido de construção de um movimento popular capaz de barrar as reformas nefastas do governo neoliberal HOJE para criar clima para sentar-se com empresários e representantes da igreja do Mercado visando 2022 é condenar diariamente os trabalhadores e trabalhadoras a morrerem de covid-19, fome e doenças. O lulismo já mostrou o que representa: Esvaziamento dos programas de esquerda, burocratização dos sindicatos, rejeição a ideia de participação popular na política. É algo que deveríamos rejeitar, porém não é que a esquerda hegemônica não aprenda, ela apenas não deseja mudar as coisas em benefício dos mais pobres, mas apenas participar do poder.

É isto. Qual a solução? É a mesma dita aos ventos por estes ai que hoje sentam e comemoram a possibilidade de 2022 com Lula, a saber, poder popular, participação dos sindicatos e organizações de trabalhadores e movimentos sociais na política de forma ativa, visando dar sustentação a um governo de esquerda. Na cabeça de alguns, todavia, Lula vale por todos os sindicatos, movimentos sociais e coletivos do Brasil e consegue segurar balas, tal qual Clark Kent e usará seus raios lasers oculares contra os militares no caso de uma nova tentativa de intervenção militar ou golpe parlamentar.


Desejo-lhes boa sorte nesta empreitada e espero que Lula tenha superpoderes, pois, se não tiver e a mesma estratégia de 2002 for seguida, estamos condenados.


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