Por Darlan Reis Jr, historiador
Saiba quem definiu a política para a Educação no Brasil nos últimos trinta anos.
A pergunta do título desse artigo parece ter uma resposta simples: quem define a política para a Educação no Brasil são o Ministério da Educação, o Conselho Nacional de Educação, as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação e os respectivos conselhos estaduais.
Mas não é bem assim que as coisas funcionam. Existem outros agentes nos bastidores, que definem as diretrizes, as políticas, os programas e pasmem, em alguns casos, até o conteúdo do que deve ser ensinado.
Somos levados a acreditar que professores, estudantes, pais, “gestores” da Educação e a sociedade em geral, através das organizações não governamentais e fundações, são protagonistas na definição das políticas educacionais. Basta ver a quantidade de fundações que se apresentam como benfeitoras da Educação, bem como os discursos eleitorais de boa parte do espectro político brasileiro, que afirmam que a Educação é prioridade.
Quando pensamos em construir uma casa, sabemos que se deve procurar os especialistas no assunto: engenheiros, arquitetos, mestres de obra, pedreiros, serventes. Se a questão é sobre a área da saúde, recorremos aos médicos, enfermeiros, técnicos, biomédicos e demais profissionais do setor. E assim, para cada área das atividades humanas, temos profissionais que entendem dos assuntos, porém a questão não é apenas de ordem técnica, mas principalmente de ordem política.
É a política que determina as ações nessas áreas: seja uma política habitacional, sanitária, de transportes, nos esportes e também é assim na área da Educação. Pois bem, pelo menos nos últimos trinta anos no Brasil, quem definiu a política para a Educação no Brasil foi o Banco Mundial (The World Bank).
O Banco Mundial é uma instituição financeira, com sede nos Estados Unidos da América, que foi fundada no ano de 1944, sendo composta por cinco entidades:
1) The International Bank for Reconstruction and Development (IBRD), conhecida no Brasil pela sigla BIRD;
2) The International Development Association (IDA);
3) The International Finance Corporation (IFC);
4) The Multilateral Investment Guarantee Agency (MIGA);
5) The International Centre for Settlement of Investment Disputes (ICSID).
E por que uma instituição financeira tem tanto interesse pela Educação nos países do Terceiro Mundo, incluindo o Brasil?
Vejamos quais foram as diretrizes indicadas pelo Banco Mundial que foram aplicadas pelos governos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Luís Inácio Lula da Silva (PT), traduzidas em políticas e programas de governo que estão presentes até hoje, sendo muito aplaudidas por diversos setores, quando na verdade, atenderam aos interesses do Banco Mundial.
Dentre os pontos centrais da política definida pelo Banco Mundial estão:
- A Educação vista como fronteira econômica a ser explorada.
- A formação de trabalhadores adaptados às novas exigências produtivas.
- A consolidação da Democracia Liberal e a promoção da estabilidade política. (O Banco diz claramente, Educação para evitar protestos e descontentamento social).
- A Educação vista como garantia de oportunidades para os cidadãos.
Para atingir esses propósitos, o Banco Mundial determinava que deveriam ocorrer “reformas no Estado” afim de garantir a “boa governança” e “fortalecer a sociedade civil”, no combate à pobreza, com “serviços sociais eficientes”. A cantilena neoliberal transformada em objetivos gerais para as sociedades. “Melhorar a Educação” colaboraria para o apoio da população às “reformas imprescindíveis”: privatizações e liberalização comercial.
No âmbito da Educação, as palavras de ordem foram: “gestão local”, “financiamento público e privado”, “avaliação externa”. Não é por coincidência que nos governos FHC e Lula tenham surgido as políticas de descentralização da gestão e dos recursos na educação, a criação do FUNDEF e posteriormente do FUNDEB, os parâmetros de avaliação externos (ENADE, ENEM, SAEB, Prova Brasil, “Provinha”, etc.), os projetos de “voluntariado”, a chegada e crescimento das inúmeras “Fundações” de empresas privadas, que dizem se preocupar com a educação brasileira.
A política de medição de resultados, de busca pela “eficiência”, o discurso meritocrático e principalmente a ideia de que não é a quantidade de recursos que importa, mas sim a “gestão eficiente” dos poucos recursos existentes para o setor, é que seriam decisivos para o “salto de qualidade” na Educação.
Sim, o Banco Mundial foi determinante na definição das políticas para a Educação no Brasil, nos últimos trinta anos. Tudo permeado de programas, cursos, formação, que vemos constantemente sendo bombardeadas sobre os professores e estudantes – “educação para o empreendedorismo”, “educação fiscal”, “eficiência, mérito, avaliação externa”. Quem está no chão de sala de aula sabe bem ao que eu me refiro.
Sem contarmos a política nefasta do Governo Jair Bolsonaro, que não obstante os parâmetros neoliberais de privatização e sucateamento do ensino público, promove a perseguição contra a Ciência, as universidades e escolas públicas, os professores e os estudantes, através da tentativa reacionária de implantar um modelo inspirado na Ditadura Militar brasileira. Mas isso é um assunto que exige outro artigo.
Não, não somos “todos pela Educação”, pelo menos, não por essa Educação que querem nos impor.
Quase todas as autoridades constituídas afirmam que a Educação é uma prioridade para o país, dizem que os profissionais do setor devem ser valorizados, mas entre os discursos e as práticas ocorre uma distância quase estratosférica.
Quanto ao professor, bem... Qual é o lugar, ou melhor, a posição dos docentes nos sistemas educacionais, nas redes de ensino, na estrutura organizacional e burocrática do Estado? E nas instituições privadas de ensino?
O professor é um trabalhador assalariado, em diferentes regimes de trabalho – estatutário, temporário, celetista, informal. De que maneira, as condições estruturais afetam o labor docente? E as relações sociais de trabalho e de poder? Diante do predomínio da concepção neoliberal, de que a Educação é um “serviço” mais do que um direito, o professor muitas vezes é orientado a ser um “gestor” de conteúdos e de conflitos.
Na Educação, somos mesmo “Todos pela Educação”? E o mais importante, de qual Educação estamos falando? Para quem? Com quais objetivos?
Referências:
MOTA JUNIOR, William Pessoa da; MAUÉS, Olgaíses Cabral. O Banco Mundial e as Políticas Educacionais Brasileiras. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 39, n. 4, p. 1137-1152, out./dez. 2014. Disponível em: http://www.ufrgs.br/edu_realidade
MÉSZÁROS, István. A Educação para além do Capital. 2ª Edição – São Paulo: Boitempo Editorial, 2005.
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