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Foto do escritorPeterson Leal Pacheco

DEMOCRACIA EM CHEQUE?

Marcione Oliveira e Peterson Leal Pacheco

Desde as lutas pelas Diretas Já, a luta dos pobres, das mulheres pelo voto, com o objetivo de escolher nossos representantes, nunca foi tão baixo o desejo de se votar.

Segundo dados da Justiça eleitoral, apenas 731 mil jovens de 16 e 17 anos estavam inscritos para votar até fevereiro de 2022, o que representava menos de 10% da população brasileira nessa faixa etária. O número era o mais baixo desde 1992.

Observamos que esse baixo índice de jovens cadastrando o seu primeiro título de eleitor, tem motivado iniciativas de artistas renomados na mobilização dos jovens eleitores de 16 e 17 anos a se cadastrarem em tempo para o voto em 2022.



Mas, de que formas podemos compreender melhor este baixo interesse pelo voto entre os jovens?

Pode não haver consenso sobre uma resposta única e definitiva para essa inquietação. Mas, um caminho muito promissor pode surgir quando pensamos no tipo de democracia que temos experimentado, no mundo, mas, sobretudo nas nossas experiências democráticas no Brasil.


Fica claro que precisamos estimular nossa democracia para além do voto e precisamos produzir instrumentos e espaços que estimulem e ajudem as juventudes incorporarem o componente político em todos os seguimentos em que eles se inserem.



A pequena adesão em relação às eleições e mesmo as baixas taxas de associativismo que podemos notar entre os jovens não podem vaticinar nenhuma conclusão apressada. As juventudes expressam, em relação às eleições, um comportamento mais ou menos crescente na sociedade, basta acompanharmos os crescentes índices de abstenções, votos nulos e brancos nos sucessivos pleitos.

Também não é possível concluir que as juventudes tenham desinteresse por questões coletivas, por direitos fundamentais, por mais justiça e menos desigualdades. Pesquisa feita pela IPEC ( empresa criada pelos ex-executivos do IBOPE) reuniu, em Setembro de 2021, dados de entrevistados com idade entre 16 e 34 anos de todo Brasil. O objetivo da pesquisa foi identificar nesse corte populacional suas percepções sobre questões políticas e sociais.



O papel desempenhado pelos partidos políticos parece que não tem sido eficiente no sentido de contornar a crise de confiança que a juventude deposita nessas instituições. Mas, a mesma pesquisa está longe de identificar uma juventude alienada e desconectada dos debates políticos e sociais. Por exemplo, 40% dos entrevistados afirmaram não concordar com a afirmação de que a divisão entre esquerda e direita na política não faz sentido. É muito, sobretudo quando o grau de adesão e confiança nos partidos é tão pequeno.



Outro resultado importante da mesma pesquisa indica que os entrevistados responderam de forma contundente estarem muito preocupados com bens e direitos coletivos. Os jovens entrevistados percebem também alguns valores centrais para a atuação política: 62% deles acreditam que o combate à fome e à pobreza deveriam ser prioridades. A preservação da Amazônia e do Meio Ambiente aparece em 27%



Os resultados da pesquisa IPEC são mais um elemento para refletirmos sobre as formas como as juventudes se aproximam das questões políticas, e, importante, de que maneira essa juventude enxerga o debate político e a democracia.

Precisa ser uma tarefa de partidos, ongs, sindicatos, grêmios, organizações sociais de uma forma geral, formular caminhos para que se estabeleçam relações mais estreitas com os muitos tipos de juventude brasileira. Talvez seja um dos desafios mais agudos nessa nossa democracia tão tutelada e nessas nossas instituições tão frágeis melhorar os espaços de participação política das juventudes, e, importante, contar com os jovens como protagonistas no redesenho da democracia e na oxigenação das nossas instituições.

Na pesquisa IPEC é explorado dois aspectos muito centrais quando o debate é o tipo e a intensidade de participação das juventudes nos debates e nas esferas políticas.




Uma parcela imensa dos entrevistados responde que percebem o debate político como sendo algo praticado de uma forma muito agressiva, muito intolerante e que, sobretudo nas redes sociais, o debate político funciona muito mais como maneira de separar pessoas e idéias do que unir e somar forças.

Essas péssimas experiências no debate político, a falta de espaços políticos e estratégias de engajamento político-social acolhedores e capacitadores culminam nessa preocupante relativização do entendimento e do papel que a democracia pode desempenhar na vida social.


Seria imensamente positivo que entidades estudantis, como a UBES (União Brasileira de Estudantes Secundaristas) e a UNE, retomem com força campanhas de criação de grêmios estudantis, centros acadêmicos, entidades de representação de estudantes nas cidades, bem como precisamos reforçar e estimular cada vez mais as organizações da sociedade civil (entidades de bairro; clubes de leitura; agências de fomento à cultura popular, etc) sempre tomando em conta o necessário protagonismo dos jovens na formulação e na condução dessas iniciativas. Dificilmente as juventudes vão se sentir representadas e interessadas na participação de processos em que os jovens, justo eles, são platéia ou massa passiva.

Decerto, a democracia não pode apenas significar o momento de eleger um representante. As práticas democráticas precisam ser muito mais amplas e agudas do que a mera e passiva democracia representativa. Cobrar dos representantes ações em favor das medidas que justificaram sua eleição, fiscalizar e acompanhar a vida pública nas suas mais diversas escalas (local; municipal; regional; nacional; mundial), participar dos espaços públicos, tudo isso é bom e pedagógico.

No entanto parece que se faz muito necessário a formulação de novas bases de produção da democracia. De uma maneira que fique bastante evidente o protagonismo dos cidadãos, sobretudo das juventudes.

O gigante, como diziam, não acordou em 2013, ali experimentamos um ensaio, muito explorado pelo campo conservador, para medir se suas pautas sem bandeiras seriam aceitas em larga escala na sociedade brasileira. Um sentimento difuso foi capaz de arrastar milhares de jovens para as ruas, com pautas diversificadas e que não dialogavam entre si. O que muitos entendiam como uma espécie de laboratório de boas práticas políticas, lamentavelmente, não passou de um evento bastante capitalizado pelo campo mais conservador e sua sanha golpista.

O Brasil tem sido palco de uma onda de ataques contra direitos e contra as próprias bases democráticas mais elementares. Experimentamos contrarreformas sociais e outras tantas medidas antidemocráticas como as insistentes ações para privatização da Petrobrás, Banco do Brasil, Caixa Econômica, entre outros, que continuam na pauta atual do fascismo conservador, e são uma espécie de desdobramento e de concretização do golpe lançado ainda em 2016.

Uma democracia se faz com renovação de idéias, discussões de projetos, participação popular, imprensa livre entre outras medidas. Desta forma, estimular o diálogo político com os nossos jovens é fundamental para não cairmos em armadilhas ditatoriais.

Não existe mais espaço para tolhimento do protagonismo das juventudes ou para censuras veladas, como no projeto "Escola Sem Partido" e seus similares. A escola é fundamental para formar pensamentos, estimular a criatividade e escolher com consciência os caminhos que cada um vai pretender para sua trajetória.

Para que possamos ter uma nação mais democrática, num sentido muito mais agudo, precisamos estimular o protagonismo das juventudes, criar espaços de capacitação e formulação para os jovens, de todas as matizes, possam tomar decisões desde a escolha de representante de turma até a eleição do presidente do pais.

Talvez, esse modelo de democracia que está em crise, tenha mesmo que ser superado. No lugar, produzirmos, todos, ambientes de participação política mais produtivos, menos violentos, mais inclusivos e mais revolucionários. Nesse sentido, que bom que a democracia está em cheque.

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