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A mídia lulista, o arcabouço fiscal e o sentimento popular

Por Darlan Reis, historiador.



Foto: Hugo Barreto/Metrópoles


Enquanto o governo Lula comemora o crescimento de 1,4% da economia brasileira no segundo trimestre, o ministro Fernando Haddad anunciou prever um crescimento ao final de 2024, de no mínimo 2,8%. O que levou a mídia favorável ao lulismo, seus seguidores e entusiasmados militantes, a divulgarem felizes, que agora os críticos teriam que se calar. Nada mais equivocado. Como dizia Maria da Conceição Tavares, "o povo não come PIB". Basta ir a qualquer supermercado e ver como os preços sobem, não obstante o discurso de que a inflação está controlada.


Agora que o presidente Lula indicou o nome do próximo presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, já começou entre a mídia lulista e seus militantes, a sutil mudança sobre a questão da taxa de juros... Veremos qual será o argumento do governo, quando o presidente do Banco Central for Galípolo. Mas voltemos ao discurso do "crescimento econômico".


O site "Brasil 247" anunciou dessa maneira: "Economia sob Lula mostra crescimento consolidado e desmoraliza "mercado" e sua mídia". Prosseguiu, dizendo que: "A boa nova da economia advém de uma gestão exemplar, livre das amarras ideológicas que empesteiam o pensamento econômico conservador brasileiro".


Nada mais equivocado, ou falso, do que essa argumentação.


Qual é a "gestão exemplar" do Ministério da Fazenda? Aquela que impôs ao povo brasileiro, por iniciativa do governo e não do Congresso, a política do "arcabouço fiscal"? Política essa que ataca frontalmente direitos consolidados no Brasil, como os pisos constitucionais da saúde e da educação? O nome oficial do arcabouço fiscal, elaborado por Fernando Haddad, com o beneplácito de Lula, é "Regime Fiscal Sustentável" (PLP 93/2023). Na prática é um mecanismo de controle do endividamento que substituiu o famigerado "Teto de Gastos" de Temer, até então duramente criticado por Lula, pelo PT, pelos partidos aliados ao PT.


Com a chegada ao poder, o Governo Lula 3, implantou a partir desse ano, o "Novo Teto de Gastos / Arcabouço Fiscal". Basicamente, o arcabouço fiscal busca o "déficit zero" no orçamento público, através de políticas ditas de "austeridade", com cortes no orçamento, em diversas áreas. Mas a questão vai além disso.


Se na época de Temer, o golpista, o "Teto de Gastos" determinava o congelamento dos gastos primários pelo longo período de 2 décadas – de 2017 a 2036, o Arcabouço Fiscal de Haddad avançou no austericídio, ao buscar o suposto déficit zero. Isso mesmo, eles conseguiram avançar em termos neoliberais, o que já era ruim à época de Temer. Basicamente, a ideia desenvolvida na prática por Haddad e sua equipe é:


  1. Aumentar a arrecadação, elevando as receitas. Para tanto, retirar isenções e subsídios para alguns setores da economia, aumentar a taxação em certas atividades e, pasmem, fazer um "pente fino" nos benefícios sociais, que, mesmo com algum grau sempre existente de fraudes, o tal pente fino busca atingir um índice de cortes, antes de verificar quantos cometeram as fraudes. Como um governo indica uma "meta" de corte em benefícios sociais, a não ser para atingir o seu intento orçamentário? Ou seja, o ajuste fiscal é mais importante do que a vida do povo pobre, que recebe auxílios.

  2. Atacar os pisos constitucionais da Saúde e da Educação, para isso, lançando "balões de ensaio", sobre o tema, altamente impopular. Outra proposta "pensada": desindexar os benefícios previdenciários em relação ao valor fixado oficialmente para o salário mínimo. Não é à toa, que todos os dias a grande mídia faz matérias sobre o "problema da previdência". O que configura uma traição não é a grande mídia fazer isso, mas sim um governo eleito para combater essa política, tentar aplicá-la, dissimulando a questão, lançando balões de ensaio, colocando seus ministros para iniciarem a discussão, mesmo que depois o presidente Lula faça aqui e acolá, alguns discursos de que os "pobres" não serão atingidos.

  3. Anunciar um corte de 25 bilhões de reais no orçamento do ano que vem, ou pelo menos a "intenção" de fazê-lo.

  4. Continuar uma política de privatizações, através de "parcerias" público-privadas, até de serviços de água e esgoto; de presídios, creches e escolas. E não são apenas governos de Direita que promovem esse caos, mas vários governos estaduais e municipais, ditos "progressistas".


Ao mesmo tempo em que faz anúncios sobre o crescimento econômico e as discussões que agradam à Faria Lima, no que diz respeito ao Novo Teto de Gastos, o lulismo e seus aliados, enfrentando as eleições municipais desse ano, faz o chamamento para "enfrentarmos o fascismo", ao tempo em que se assusta com os "fenômenos eleitorais" da Direita, de coachs milagreiros a reacionários tradicionais, que elaboram um discurso supostamente antissistema, mas que não é nada mais do que a tentativa de capturar o sentimento de indignação de boa parte da população, com a vida difícil, desigual e injusta em que vive o povo brasileiro. Mesmo que vários governos ditos de "esquerda" ou "progressistas", nos estados e municípios, pratiquem políticas de ataques a direitos sociais, de privatizações, de permanente despolitização da política, com campanhas estilo "tik tok", que buscam infantilizar o eleitorado.


Qual sentimento uma política de austeridade econômica, que reduz a capacidade do Estado de oferecer serviços públicos, fazer a economia crescer de modo que melhore de fato a vida da classe trabalhadora, irá provocar? Qual sentimento que não a frustração na política, a descrença no que dizem os candidatos antes das eleições? Não se trata apenas dos ataques da mídia burguesa, do Centrão, da "correlação de forças" no Congresso, da ideologia dominante neoliberal, que inclusive está nas escolas, universidades, muitas igrejas, partidos, etc. Eles já dominam, tem a hegemonia. E ainda temos um governo que diz "cuidar dos pobres" ao tempo em que pratica a política liberal, ao agrado dos banqueiros e da "Faria Lima", mesmo que seja preterido por esses.


A política de agradar ao mercado, aos banqueiros, à Faria Lima, à mídia hegemônica, não se traduz em alívio nos ataques do lado de lá, mas gera o sentimento de revolta, frustração e descrença em amplos setores do povo. Depois não venham vocês, adeptos do governo, defensores do lulismo, dizer que a extrema direita cresce apenas porque tem recursos financeiros ou "sabe se comunicar". Vocês também são responsáveis pelo avanço da Direita, pois essa capitulação constante, o rebaixamento da política, a adoção da política econômica dos nossos inimigos de classe são o fermento que eles precisavam.


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